sábado, setembro 30, 2006

DOIS PERDIDOS NA NOITE FRIA

Não há solução! E o melhor é o movimento de busca. Mas buscar o quê, se todo o retorno ao passado é vão. O efeito curativo é de momentânea renovação da alma.
Ele lembrava do casamento há mais de uma década atrás. E de tudo mais relacionado à adolescência. Ela lembrava que foge de casamentos a la séc. XVI sujeitos a index e fogueiras. Ele se confessa um possessivo. Ela uma boêmia. E Deus era tema-eixo dos desabafos. O reconhecimento de um pelo outro como o amigo ouvinte para os sonhos e as burradas da vida. E são tantos... tantas as idas e tantos os vôos de menina. E são tantos os momentos de tédio e alegria do rapaz.
Um em frente ao outro a confessarem seus fracassos – esqueceram completamente das vitórias. Um com a vida diferente – oposta!? – a do outro. Escolhas de vida: água, óleo e vinho. Um queria um pouquinho da vida alheia, embora suas naturezas fossem determinantemente contra os geradores de felicidade que cada um possui e criou para si.
Foi feita uma significante revista dos erros sem direito a erratas nem a choro – discurso seco de adultos calejados. Também não havia música, só o som de vozes e ruídos produzidos por talheres, copos. Além da presença dos homens, só o vento levando a garoa finíssima, insistente como a memória. A menina que corria pela rua e ficava na janela mexendo com o menino que passava não existe mais... Os adolescentes do Garagem se perderam também. Dois estranhos de si mesmos e íntimos das angústias um do outro, sem possibilidades de retorno e com dúvidas.
Muito ficou engasgado por não haver palavras que comunicassem o gosto amargo do não-arrependimento pelas escolhas feitas em cima dos mais abstratos pensamentos e dos mais concretos sentimentos.
Despediram-se:
- Boa viagem!
- Obrigado.
Foram para suas casas e dormiram agradecidos pela cumplicidade sem cobranças, sem ironias, sem conselhos-clichês, sem necessidade de continuidade de confissões. Afinal, não há desejo de recomeços. Cada um é sua própria solução...

Angélica de Oliveira Castilho
Rio de Janeiro, 13 de maio de 2006.

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